Sunday, 31 August 2008

DANKE SUÍÇA



terra do chocolate, do relógio e dos canivetes.


dos transporte público sem catraca, que dá para andar sem pagar se quiser, porque raramente aparece um fiscal pra ver se você tem bilhete, mas ainda assim as pessoas pagam.


terra de várias línguas oficiais, e mais outras tantas como a nossa.


terra da mulher brasileira prostituita, como em tantas outras terras, inclusive a nossa...(?)


terra da mulher brasileira empregada doméstica, como em tantas outras terras, inclusive a nossa ...( ?)


terra de bancos, e muitos brasileiros neles.


terra de um silêncio que parece herdado e não desejado.


terra de ruas mais limpas que o seu sapato novo


terra de suícidios


terra de lagos e alpes


terra de gente


e isso basta!

e na prateleira do mercado


mais surpresa!
no supermercado você encontra ----------

e eu só tirei foto!

só para mulheres


você sai para um inofensivo almoço com as amigas.
antes de pagar a conta resolve retocar a maquiagem, em outras palavras, usar o banheiro.
entra na cabine e vê uma máquina.
o que esta maquina, ao lado do vaso sanitário, teria a oferecer para uma mulher?

alternativa A ( ) absorvente
alternativa B ( ) batom
alternativa C ( ) revista feminina
alternativa D ( ) nenhuma das alternativas acima

Se estamos falando do restaurante japonês Yooji´s em Zurich, acertou quem escolheu a alternativa D.
Com alguns míseros francos suíços você pode adquirir um delicado vibrador, e o que é melhor, testá-lo ali mesmo.
E os homens morrem de curiosidade para saber o que as mulheres fazem juntas no banheiro.
Juntas elas fazem o óbvio, mas sozinha, nesse banheiro, se a fila estiver grande...
Eu estava acompanhada.

TIREI
FOTO!



Comédia da vida privada

imagem: Gustavo Ferri


E falavamos sobre o que mesmo no chá da tarde no SPRÜNGLI ? Ah! Ainda sobre o silêncio suíço. Para minha eterna admiração descubro que é proibido dar descarga ou tomar banho depois das 23h00. A diferença de hábitos entre os povos é surpreendente.


Tivemos um tipico dia de inverno, chuvoso, mas ainda estamos no verão. A noite chega. Meu anfitrião serve uma deliciosa sopa e de sobremesa uma maravilhosa torta de chocolate feita pela anfitriã. Cozinham muito bem!!! Nem posso retribuir lavando a louça porque a máquina faz as honras da casa, apenas recolho os pratos.


Horas passadas, os anfitriões se recolhem e eu ainda sem sono. Sinto um incontrolável desejo de ir ao banheiro. Imediatamente sou tomada pela angústia. Lembro-me da converso no café e sinto vontade de estar em qualquer outra parte do mundo depois das onze da noite, menos na Suíça.
Não me deixo abater, sei que tenho controle emocional suficiente para sair de situações difíceis, uma boa oportunidade para testa-lo. Vou ao banheiro e olho fixamente a patente, que é como minha anfitriã gaúcha chama a privada, tenho uma idéia! Vou até a cozinha pegar um balde. Basta enchê-lo de água e jogar na patente, assim evito o “barulho” da descarga e me mantenho dentro da lei.


Não acredito! Meus anfitriões estão dormindo com a porta do quarto aberta. A cozinha é americana e se eu acender a luz vou acorda-los. Procurar o balde no escuro produziria mais barulho do que a descarga. Operação abortada. Volto ao banheiro. Olho fixamente a patente esperando que dela venha alguma idéia. Shit! Tudo que sinto é um desejo incontrolável de me entregar a ela. Mas não me apetece a idéia de deixar para o dia seguinte, boiando, os vestígios da noite anterior...
De repente um barulho. Salva pelo gongo. Em um outro apartamente, acima do nosso, alguém infringindo a lei. Uma descarga acabara de ser acionada. O alívio foi imediato, eu que a pouco estava enfezada com aquela situação, relaxei. A natureza pode enfim respeitar o relógio biológico. Me recompus, apertei a descarga sem culpa...e quer saber? Estou cagando pro silêncio suíço.


Desfazendo equívocos
No dia seguinte, conversando com um suíço, que fala português of course!, quis entender melhor essa lei. Quando questionado sobre, ele apenas riu, riu muito. Assim como rimos quando nos perguntam se nos locomovemos por cipós, se a capital do Brasil é Buenos Aires, se andamos de tanga e que toda mulher brasileira é “fácil”. Riu descortinando meu olhar superficial de viajante, de estrangeira. Riu mostrando que a “gringa” aqui sou eu.

Wednesday, 27 August 2008

O silêncio dos inocentes





Sempre morei em casa. Alicerces na terra e crianças brincando ao redor. E quando digo brincando quero dizer gritando, pulando, vibrando. Criança por perto significa barulho. Adoro a poluição sonora da vibração das crianças. Quando fui morar em apartamento descobri que as crianças também gritavam por lá, e quem não estivesse feliz que se mudasse para o ultimo andar.
Mas por que tanto barulho por nada?

Aqui na Suíça as crianças as vezes são o pivô de verdadeiras saias justas. Todos são muito silenciosos. Não se fala alto em lugares públicos, como manda a etiqueta, se cultua o silêncio, logo, um serzinho ainda não domesticado que perturbe a ordem deve ser “extraditado”.

No transporte público vejo mães constrangidas quando seus anjinhos aumentam o tom de voz, tentam desesperadamente conte-los antes que chamem a atenção dos demais usuários que se voltam para o pequeno passageiro indesejável.
Nos bares os pais portadores de crianças sonoras podem ser convidados a se retirarar do ambiente caso a espontaneidade da mesma não consiga ser controlada. Muitos aceitam o convite a ainda deixam seu pedido de desculpas.
Mas felizmente, para a terra dos alpes, esses pequenos indomáveis crescem e aprendem que é necessário evitar o contato, seja ele visual (desvie o olhar quando notado), pelo tato (se tocar em alguém se desculpe) e sonoro . O sonoro é especialmente mais nefasto porque é uma contato que atinge muitas pessoas ao mesmo tempo e a longas distâncias.

Adoro o silencio suíço, escrevo de madrugada porque acho o silêncio essencial, mas devo confessar que adoro o ruído das crianças, especialmente as daqui.








Brasileira tipo exportação


foto: Clube da Luluzinha Brasileira

Eu estou em “dromus”, que posso traduzir como estou em marcha, em curso.
Antes de iniciar meu estudo na Inglaterra sobre dramaturgia fiz uma escala na Suíça para visitar uma amiga brasileira, que não é prostituta.


Explico: assim como no século passado as polacas, que entravam no Brasil, faziam da prostituição profissão, o mesmo acontece aqui com boa parte das brasileiras. Vindas ou trazidas, as brasileiras tipo exportação, oferecem “o que há de melhor no Brasil”, nosso calor humano, que aqui pode ser traduzido de várias formas. Depois de algum tempo algumas conseguem a tão sonhada promoção, casam-se com suíços. Isto proporciona status aqui e no Brasil.


Quando falava da minha viagem à Europa, ouvia frequentemente: “boa sorte. Quem sabe você consiga um inglês para casar”.


Quando o que eu queria ouvir era: “bom trabalho, que as portas se abram ainda mais”.


Quando viajava para o nordeste nunca ninguém me desejou: “se acaba lá, e volta casada com algum moreno delícia”.


Talvez porque um nativo não seja um bom negócio, não me daria um futuro decente. Já um gringo é a garantia da terra prometida, a salvação para uma mulher latino americana, sem falar que o casamento é o melhor investimento que uma mulher pode fazer. Os preconceitos que eles têm sobre nós, talvez sejam os mesmos que nós temos e sob os quais construímos nossa própria imagem.


Ao entrar na Suíça, embora tenha sido muito bem tratada, apresentei carta convite dos meus amigos que moram aqui, disse quanto tempo ficaria...Inspeção de rotina. Perguntei ao simpático moço, que deve ser da imigração, se sempre era assim com brasileiros, e ele com um sorriso amável respondeu balançando a cabeça afirmativamente.




O bêbado e o motorista


Eram aproximadamente 11h00 da noite. Voltávamos do cinema. O TRAM pára (em Zurich é desnecessário dar sinal, o TRAM pára em todos os pontos). Dentro dele havia algo no chão impedindo a passagem, ou melhor, alguém. Sim. Um homem de aproximadamente quarenta anos. Ao seu lado uma mochila e uma garrafa de alguma bebida que certamente não era água. Todo o TRAM estava impregnado do cheiro dele. Ele murmurava algo, e ainda que falasse alto eu não conseguiria entender seu suiço-alemão.

Como desconheço sua identidade e não acho cortês defini-lo pela quantidade de álcool que havia ingerido naquele dia, o chamarei de Mister Milk, aproveitando para fazer uma referência à Suíça, que é conhecida também pelo seu leite.

Meu olhar de viajante foi sendo surpreendido a cada novo acontecimento.

Acontecimento 1: Um dos passageiros se levanta, vai até Mister Milk, pega-o pelo braço. Com todo cuidado do mundo tenta ajuda-lo a retornar aquele que deveria ser seu assento. Mister Milk olha para o gentil cavalheiro e parece não entender o que ele deseja, resmunga algo e permanece deitado no chão.

Acontecimento 2: O cavalheiro é demovido da idéia de resgatar Mister Milk pelo motorista do TRAM, que assistia tudo de sua cabine. O motorista compadeceu-se do gentil homem, parou o TRAM e informou que já havia avisado a polícia. Nesse momento uma suave indignação* toma conta de mim, olho com antipatia para o motorista. OK, Mister Milk tem um cheiro insuportável, está obstruindo uma das entradas, mas chamar a polícia!!!!! ? ? ? Não é para tanto!!!

Acontecimento 3: O TRAM pára novamente. Entram dois policiais. Olham para Mister Milk e falam algo. Fico tensa. Não esperava que meu primeiro passeio em Zurich terminasse com uma cena dessas. Um dos policiais retira do bolso uma luva de borracha e a calça. Em seguida pega Mister Milk pelo braço. O que vejo “desprogramou completamente meu sistema”. Sem truculência, sem falar alto, sem projetar o peito para fora, com um misto de delicadeza e cortesia, o policial encaminha Mister Milk para fora. Pelo que ouvi dizer, nosso protagonista seria levado para um abrigo. Mas programação é programação e não pude deixar de pensar: longe dos nossos olhares o pau vai comer.


Estou só há dois dias fora do Brasil, pouco tempo para realmente acreditar que as coisas podem ser diferentes.

*suave indignação é quando você não concorda com algo, mas não diz absolutamente um A para modificar o que o desagrada


SUAVE INDIGNAÇÃO

about...


Passando em Zurich só para dar um oi para os amigos. E o povo no Brasil perguntando: a dramaturgia vai começar quando?
Dramaturgo é a pessoa que cria histórias para o teatro. Mas vou confessar que não crio nada. Olho para a direita e para a esquerda antes de atravessar , tropeço na calçada, esbarro na moça apaixonada que não olhava pro caminho, digo ¨bom dia¨ para o senhor que acha que o dia não está tão bom assim, sorrio, prossigo escrevendo...escrevendo tudo isso de outra maneira:
mesmo sem achar que o dia está tão bom assim, prossigo. Na calçada vejo a moça direita dar bom dia ao senhor que estava no caminho, ele tropeça antes de atravessar mas sorri. Esbarro no que olho e continuo escrevendo com a esquerda.

A dramaturgia já começou.
foto: Tati lendo. Almoço no vegetariano HILTL.
Por toda a cidade, nos estabelecimentos comerciais, você pode deixar seu guarda-chuva na porta que quando voltar ela estará lá.

O que não pode faltar na mala


A viagem começou. Muitas coisas novas e diferentes. Descubro a parcialidade do meu olhar. Essa descoberta me inibi. Falar sobre o desconhecido é infinitamente mais perigoso do que viver o desconhecido. Exige muito mais responsabilidade, exige respeito com a outra cultura. O ¨eu acho¨ , em qualquer situação é uma expressão delicada, em ¨universos paralelos¨ pode ser uma afronta diplomática.
O que o viajante deve saber é que não existe certo ou errado, mas que o diferente está em toda parte. Comparações do que se vê em relação ao que se vivia perdem o sentido na metade da frase. O histórico é outro, o continente é outro, o clima é outro. O viajante mais atento pode observar a Lei de Darwin se processando. Por todos os lados a espécie se protegendo, tentando uma evolução. No entanto o que se entende por ¨espécie¨ varia de pessoa para pessoa: para uns sãos os animais, para outros todos os seres vivos, outros defendem que a espécie é a família e há ainda os que acreditam que preservar a espécie é salvar a própria pele. Evolução da espécie também pode ser compreendida de várias maneiras, desde desenvolver as potencialidades humanas até comprar o carro do ano.
O viajante que saiu com uma mochila nas costas mas deseja voltar com algumas malas para casa sabe que no câmbio mundial a moema que mais vale é a escuta.
Deixe todas as certezas em casa.
A dúvida será seu melhor guia.