todas as nacionalidades - all the cultures
Algumas grandes decisões em nossa vida são tomadas de uma hora para outra. E assim foi em relação a minha viagem à Londres. Não sei exatamente porquê tinha tanta curiosidade em conhecer estas terras, mas sabia que precisava estar lá em algum momento.
E foi assim de uma hora para outra. Em 1988 decidi: Eu vou. Em 2008 eu fui. Vinte anos se passaram desde a decisão à realização, “de uma hora para outra”, como muitos disseram. Não foram vinte anos maturando a idéia, nesse meio tempo vivi outros lugares, descobri outros territórios dentro do meu próprio país e ao descobri-los me apaixonava ainda mais pela possibilidade de andar descalça na areia, tomar água de coco e açaí na tigela, ter a pele morena rosa, ouvir o mar...naturalmente fui me distanciando do desejo de ver castelos, usar casacos pesados e viver entre recessivos (olhos claros, cabelo loiro, pele branca).
No entanto, se deu uma dessas coisas estranhas que acontecem sem explicação. Um inglês, um dramaturgo, Noel Greig, reaviva o antigo desejo e não o faz a distância, veio me cutucar em terras tupiniquins. E a decisão que tinha sido tomada há vinte anos enfim se concretizou.
Afinal o que VOCÊ vai fazer em Londres?
Afinal o que EU vim fazer em Londres?
Escrever.
Em que curso, onde é a escola, quanto tempo?
Curso? Escola? Tempo....
A matéria aqui é outra e a didática também. Se no Brasil, meu olhar acostumado, encontrava as histórias em esquinas, vilas, feiras, caminhos, amigos, desconhecidos...O que fazer com esse olhar numa cidade em que a mão é esquerda, e saber olhar para o lado certo ao atravessar a rua é uma questão de sobrevivência? Sem esquecer da escuta! A informação não vem trazida pelo vento já traduzida no bom e claro Português. E sabe- se lá em que língua essa informação pode chegar! A cada momento um idioma diferente. Aqui as histórias não chegam prontas. Não basta sentar e deixar que elas se contem, tenho que traduzi-las. E por vezes ela me é apresentada através de uma expressão fechada , um tom de voz mais elevado, um olhar perdido, uma garrafa vazia ao lado da menina desfalecida na calçada, do silêncio quando a situação pedia fala.
Londres definitivamente , para mim, não é uma cidade de paisagens. É uma cidade de humores, da convivência entre os muito diferentes, das desejadas “chegadas” e das infindáveis “partidas”. Dos enlaces que mal iniciam, esquivam-se do meio, evitando o fim, por vezes, inevitável.
Não é uma cidade fria, é uma cidade reservada, não diria discreta, pois a deselegância indiscreta de suas meninas não me permitiria fazê-lo. É uma cidade que não lhe oferecerá um abraço, mas deseja recebê-lo e sabe retribui-lo, à sua maneira.
Seu povo é gentil e solícito quando consegue notar a presença do outro, mas para tanto, é necessário deixar os tablóides repousados nos assentos do metrô e perceber a pessoa sentada no assento do metrô, logo ao lado, bem pertinho, respirando junto.
As pessoas em Londres não merecem o clima de Londres: céu cinza, a noite que começa às quatro da tarde, o sol que faz charme e se recusa a aparecer... As pessoas em Londres merecem luz, uma luz que ilumine os olhares, que possibilite enxergar a terra que ninguém vê, como bem sabe Cora.
As pessoas de Londres podem inspirar histórias mais coloridas, mas para existir cor, tem que haver mistura. Uma mistura que já acontece, timidamente, revelando alguns tons, mas que ainda guardam suas nuances.